Depressão



Há pouco tempo, voltei a um bosque em que brincara quando criança e vi um carvalho, enobrecido por cem anos, em cuja sombra eu costumava brincar com meu irmão. Em vinte anos, uma enorme trepadeira grudara-se a essa sólida árvore e quase a sufocara. Era difícil dizer onde a árvore terminava e a trepadeira começava. Esta enrolara-se tão completamente em torno da estrutura dos galhos da árvore que suas folhas, a distância, pareciam ser as folhas da árvore. Só de perto se podia ver como haviam sobrado poucos ramos vivos, e quão poucos e desesperados gravetos brotavam do carvalho. Tendo acabado de sair de uma grande depressão (…) tive empatia por aquela árvore. Minha depressão crescera sobre mim como aquela trepadeira dominara o carvalho. Fora uma coisa sugadora que se embrulhara a minha volta, feia e mais viva do que eu. Com vida própria, pouco a pouco asfixiara toda a minha vida” - (Andrew Solomon / Livro: O demônio do meio-dia)

Falar sobre depressão é mais fácil por metáforas. É difícil descrever as sensações e sentimentos que caracterizam uma depressão, e descrever os sintomas apresentados pelo CID-10 é diminuir e esvaziar uma doença que é cheia de significados. Já o texto acima, achei de uma riqueza impressionante.

Para falarmos de depressão, a primeira coisa que precisamos destacar é o que não é depressão. Tristeza não é depressão. Todos nós ficamos tristes e sofremos em muitos períodos de nossas vidas. A vida é repleta de perdas e frustrações, e é natural que soframos com elas. Também não diria que depressão é um pesar desproporcional a causa, pois a quem cabe definir o quanto se deve sofrer por algo? Podemos sofrer intensamente por algo e em seguida levantar a cabeça e seguir em frente com alegria e otimismo renovados.

A melhor maneira de descrever a depressão é mesmo como este algo que vai tomando conta de você, como se sugando a vida, a alegria, o otimismo e, em especial, as forças, e, quando não temos mais forças, é difícil mudar qualquer coisa em nossas vidas.

Depressão não é frescura. Não é falta do que fazer. Seja uma depressão leve - que permite ao indivíduo seguir com sua vida produtiva - ou uma depressão mais profunda - que limita o indivíduo em suas atividades profissionais e pessoais - o fato é que a depressão pode ter um efeito devastador na vida de quem sofre com ela. Diria, inclusive, que a depressão leve é, em alguns momentos, ainda mais perigosa, pois, quando nos vemos incapazes de cumprir com as menores atividades, sabemos que há algo de errado, e então, acabamos recebendo ajuda, seja por nossa própria iniciativa de ir buscá-la, seja por intercedência de nossos entes queridos. Quando nossas obrigações são cumpridas, como acontece nos casos de depressão leve, muitas vezes nem conseguimos ver a necessidade de buscar ajuda e seguimos vivendo com o manto que tinge nossa realidade de cinza e não nos permite ver soluções.

Não há, infelizmente, fórmulas mágicas para solucionar a depressão. Os remédios podem ajudar, as terapias ajudam, mas o passo inicial caberá sempre ao indivíduo deprimido, que deverá tomar consciência de sua doença e, contra todas as características de seu quadro clínico, encontrar em si as forças para buscar ajuda e retomar as rédeas de sua vida e de suas emoções.




Comentários

  1. Parabéns Dra Renata! Escrever é para poucos... e você faz isso muito bem! Gostei muito dos textos!

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